Israel só pode contar consigo mesmo – Tribuna 389

Neste Dia Internacional em Memória às Vítimas do Holocausto, escrevo artigo na TRIBUNA JUDAICA sobre a intermitente ameaça que espreita Eretz Israel. Vale lembrar também que na cidade de São Paulo aprovamos a Lei 15.059, de 14 de dezembro de 2009, de minha autoria que replica essa data fundamental no Calendário Oficial de São Paulo. Leia e compartilhe.

“Israel só pode contar consigo mesmo
Floriano Pesaro, sociólogo

Muitos de nós já ouvimos esse mote, mas, hoje se torna fundamental não o deixarmos passar de vista: “Israel can only count with itself”, ou “Israel só pode contar consigo mesmo”. Duas complexas movimentações recentes do principal aliado de Israel no Oriente Médio, os Estados Unidos, colocaram sob alerta a segurança nacional israelense.

Em primeiro lugar, em outubro do ano passado, o presidente norte-americano, Donald Trump, anunciou a retirada das tropas dos EUA do norte da Síria alegando que esta era uma luta “interminável” que nada tinha a ver com os interesses americanos na região reforçando seu caráter “não intervencionista” alardeado pela sua campanha em contraponto aos democratas.

Com esse movimento, Trump deixou Israel numa das mais delicadas situações geopolíticas e territoriais desde a Guerra de Yom Kippur, uma vez que – com a presença das tropas americanas – a região curda estava livrando-se das células do grupo terrorista Estado Islâmico e afastando as tropas – terroristas de Estado – do Irã, a Al Quds. Longe da Síria, por sua vez, longe das fronteiras israelenses.

Contudo, o que parecia um êxito em termos de intervenção internacional democrática tornou-se uma ameaça ao Estado de Israel, uma vez que Turquia passou a atacar as tropas curdas – antes aliadas dos EUA – para impedir que eles formem seu longamente desejado Estado. Com a retirada norte-americana e os ataques turcos na região, as Forças Democráticas Sírias (FDS, grupo formado por milícias de sírios curdos, árabes, assírios, armênios, turcos e circassianos) alertaram o reativamente de células do Estado Islâmico na região e a penetração pioneira de tropas da Al Quds ao norte do país. Nunca antes tão próximas às fronteiras israelenses.

Em mais um episódio da política externa norte-americana, este ainda mais recente e num cenário de escalada da hostilidade na relação entre EUA e Irã, o Presidente Donald Trump autorizou um ataque aéreo em solo iraquiano matando o General Qassem Soleimani, líder da força terrorista de Estado, Al Quds, considerado o “número 2” na ditadura iraniana e, então, cogitado para suceder o líder supremo do país Ali Khamenei.

Essa decisão sem precedentes no cenário internacional – uma vez que, embora a ficha corrida do general terrorista não seja modesta e seu envolvimento em diversos ataques terroristas seja comprovado, um ataque de um país democrático em território estrangeiro sem uma ameaça comprovada eclodiu em, pelo menos, dois movimentos: 1) pressão interna das forças políticas oposicionistas norte-americanas para a retirada das tropas do país do Iraque; 2) a promessa de revanche e vingança do Irã contra os Estados Unidos, suas instalações e aliados na região.

Ao que parece, Israel está acompanhando como um observador à escalada de hostilidade sem precedentes com inimigos poderosos à sua porta. Num cenário onde a cada dia, um novo episódio vem se somando a este complexo cenário, os Estados Unidos comunicaram e – pouco menos de 24 horas – desmentiram a retirada de suas tropas – desta vez – do Iraque, que deixaria o país livre para a entrada da Al Quds. Em outras palavras, terroristas perigosos nunca antes tão próximos de Israel.

Em que pese, previsões sejam difíceis neste complexo cenário geopolítico, é fato que a sobrevivência do Estado judeu é alvo histórico dos grupos e Estados terroristas da região e, sob essa premissa, a resposta do Irã ao ataque norte-americano – se vier – deve tomar lugar ai mesmo na região devendo colocar Israel em alerta máximo de segurança. Neste tenso cenário de incertezas e aumento de hostilidades, os EUA – nosso principal aliado – ensaia mais uma retirada de tropas forçando Israel a recordar-se: Israel can only count with itself. Atentemo-nos.”

Você conhece as olimpíadas dos judeus? – Hebraica 695

Você conhece as olímpiadas dos judeus? Leia meu mais novo artigo na Revista do Clube Hebraica SP.

“Entre julho e agosto deste ano teremos mais uma edição dos Jogos Olímpicos de Verão, desta vez, nós, brasileiros, passaremos a tocha para os japoneses que sediarão a Tóquio 2020. Mais do que nunca, num momento de tensões regionais e mundiais acirradas, o esporte ressurge como uma ferramenta para promoção da paz e da convivência harmoniosa por meio da competição tolerante, saudável e amistosa. Mas, você sabia que existem jogos olímpicos judaicos e que eles são o terceiro maior evento esportivo do mundo?

Desde 1952, Israel participa dos Jogos Olímpicos tendo somado neste período nove medalhas (uma de ouro, uma de prata e sete de bronze) e períodos marcantes como o ouro de Gal Fridman na Vela em Atenas no ano de 2004 e como o atentado de 1972 que matou 11 dos atletas de Israel em Munique. Apesar de toda a dedicação israelense aos jogos – onde neste ano prometem enviar o número recorde de 85 atletas para a Tóquio 2020, Israel protagoniza outro evento esportivo, mais conhecido da comunidade, e de proporções gigantescas.

Desde 1932, as Macabíadas reúnem milhares de pessoas em Israel e são reconhecidos pelo Comitê Olímpico Internacional reconhecidos como o terceiro maior evento esportivo do mundo com 10 mil atletas, depois das Olímpiadas e da Copa do Mundo da FIFA. Mais comumente chamadas por Olímpiadas Judaicas, as Macabíadas acontecem a cada quatro anos em Israel e os critérios para participação nos jogos se dão de duas formas: ele é aberto para atletas judeus de todo o mundo – na última edição, em 2017, participaram atletas judeus de 85 países (incluindo 500 brasileiros) – e atletas israelenses de qualquer religião.

No Brasil, embora sua grandeza, as Macabíadas ainda não gozam de tanto conhecimento como sua irmã global, mesmo que o Brasil – muitos deles atletas do Clube A Hebraica – levem o país a boas posições no campeonato, como o Bruno Pekelman que conquistou um ouro inédito na Esgrima e o Guilherme Minakawa que se tornou tricampeão macabeu no Judô. Em que pese, na última edição, a participação do sócio Ronald Lima tenha trazido holofotes da mídia merecidamente para nossa delegação.

A participação brasileira nas Macabíadas é organizada pela Confederação Brasileira Macabi sediada no Clube A Hebraica e conta com 18 clubes associados que, desde 1953, representam o Brasil na competição judaica internacional.
Agora que já conhecemos sobre o campeonato, você sabe o porquê dele ter esse nome? Macabíadas remete à vitória dos Macabeus e seu exército contra os helênicos que queriam impor seu estilo de vida ao povo de Israel na Judéia e à celebração da Festa de Chanucá após os gregos defenestrarem o óleo sagrado, restando apenas um que durou 8 dias. Yehuda e seus irmãos Macabeus eram descritos pelo general grego Bacchides como “mais fortes que os leões, mais leves que as águias e mais rápidos que os ursos”. Tinha-se, então, um exemplo de superação, garra e determinação em defesa da liberdade que resultou na retirada dos gregos.

Por isso, o campeonato macabeu é símbolo de força, resiliência e liberdade em honra a Yehuda e seus irmãos. Enquanto a próxima edição do campeonato judaico não chega – será em 2021 – nos preparamos para assistir mais uma edição dos Jogos Olímpicos de Verão em terras nipônicas onde torcemos para que tanto Brasil, como Israel façam bonito no esporte, na civilidade e na cooperação entre os povos sempre em busca da paz.

Floriano Pesaro, sociólogo”

O exercício democrático – Hebraica 694

Novo ano, nova reflexão: esse é um ano fundamental na política com efeitos na nosso dia a dia ao elegermos nossos representantes locais. À vista, sempre nossos princípios e valores. Leia e compartilhe.

“Ainda renovados com a chegada de 5780, começamos o ano de 2020 do calendário gregoriano ainda sob um clima de intensa polarização devido a um pleito acirrado e envolto de pautas polêmicas que, de nenhuma maneira, cooperam para a construção de uma agenda eficaz para os gargalos do Brasil. Nosso país, que tem eleições a cada dois anos, não é uma ilha e foi duramente impactado pelos resultados de pleitos no exterior, como da eleição nos EUA que causou uma fissura na comunidade judaica norte-americana, em especial novaiorquina, fenômeno que encontrou retumbância por aqui.

Neste ano, temos mais uma oportunidade de exercer em plenitude nossos direitos democráticos ao escolher quem vai nos representar – não na União ou no estado – mas, onde, de fato, moramos: no município. E, considerando o impacto que um gestor ou legislador local pode ter no nosso cotidiano – para melhor ou pior – temos que considerar ainda mais firmemente que nossas escolhas sejam pautadas nos princípios e valores da nossa comunidade.

Noutro artigo publicado aqui mesmo percorri o raciocínio que me leva a considerar de extrema importância a união da nossa comunidade e o papel que nossas lideranças políticas e comunitárias, como o Presidente do Clube A Hebraica, Daniel Bialski, e o Presidente da Federação Israelita do Estado de São Paulo (FISESP), Luiz Kignel, exercem para que fantasmas de perseguição não encontrem espaço em solo brasileiro e – quando encontram – se vejam absolutamente rechaçados pelas mais altas autoridades do País, sejam de que lado forem. Evitar divisões – o que não significa evitar debates construtivos – nos fazer sermos reconhecidos como uma comunidade coesa e ciente de seus direitos e deveres enquanto parte integrante da sociedade brasileira.

Essa influência que é devida à articulação de nossos líderes políticos e comunitários encontra uma força fundamental quando tem entre os representantes eleitos – seja no executivo ou no legislativo – membros da nossa comunidade. Mas, então, por que preferivelmente tendemos a votar em candidatos judeus? Fundamentalmente porque estamos seguros de que eles norteiem seus mandatos a partir dos princípios e valores que regem nossa comunidade. Tikun Olam, Tzedaká, a preservação do Meio Ambiente, dos valores democráticos, do contraditório, da liberdade, do respeito à diversidade em todas as suas formas, à ética, ao bem público, à probidade e, por fim, mas não menos importante, ao conceito de que nosso sistema representativo é pautado na “res-publica”, ou seja, aquilo que é do povo. Para assegurar essa representação, a comunidade vem apresentando e elegendo jovens – mas, não apenas – para representar esses princípios e valores, como fizemos recentemente com as eleições do Senador Davi Alcolumbre, do Deputado Estadual Heni Ozi Cukier e do Vereador Daniel Annenberg, que vêm pautando seus mandatos pelo bem público, a paz e a liberdade que tanto nos são caras.

Por isso, com o coração leve, com a mente sensata e cientes de nossa responsabilidade, vamos às urnas novamente neste 2020 gregoriano plurais – e inspirados em Israel como um exemplo inequívoco de liberdade e democracia -, mas uníssonos na defesa da nossa comunidade e, acima de tudo, dos princípios e valores que nos são ensinados para que nossa passagem por este mundo deixe como legado a paz, a prosperidade e a liberdade. Bom 2020 a todas e a todos!”

Floriano Pesaro
Sociólogo

O antissemitismo cresce no Brasil: atentemo-nos – Tribuna 388

Compartilho meu mais recente artigo publicado na TRIBUNA JUDAICA sobre os resultados graves de uma pesquisa que pouco foi comentada no Brasil: o antissemitismo no nosso país está crescendo sorrateiramente. Atentemo-nos. Leia e compartilhe.

“O antissemitismo cresce no Brasil: atentemo-nos
Floriano Pesaro, sociólogo

Em meio à enxurrada de notícias que recebemos diariamente por meio das várias redes sociais que nos conectam e nos segregam ao mesmo tempo, passou quase despercebidamente uma notícia preocupante: uma pesquisa detectou aumento no antissemitismo na sociedade brasileira, mas o título esconde a complexidade do problema que – não nos surpreende – continua existindo, mas vem ganhando espaço a galopes.

Trata-se da pesquisa da Anti-Defamation League (em português, Liga Contra a Difamação), instituição judaica dos EUA que monitora há 5 anos o antissemitismo em mais de 100 países pelo mundo, que aponta o crescimento de 16% (em 2014) para 25% (em 2019) o universo de brasileiros que apresentaram visões antissemitas, ignorantes ou preconceituosas com relação aos judeus. Esta constatação se deu por meio de perguntas que questionam se os judeus são, na visão dos entrevistados, mais preocupados com Israel ou com o país em que vivem (ou mesmo nasceram), neste caso, impressionantes 70% dos entrevistados concordam que os judeus são, independentemente de serem nascidos brasileiros, mais leais a Israel do que ao Brasil.

A essa constatação, somam-se os seguintes resultados da pesquisa com os brasileiros: 1) 22% nunca ouviu falar do Holocausto; 2) 15% acham que os judeus exageram quando relatam a Shoah; 3) 55% dizem nunca ter encontrado com um judeu na vida; e 6) 63% acham que os judeus falam demais sobre nazismo e o holocausto.

Sob um ponto de vista sociológico, me saltou aos olhos ao ler estes resultados, o contexto de desconhecimento, preconceito e ignorância que se formou em torno, novamente, de nós judeus num país que nos acolheu tão bem e que, muitos de nós, daqui somos também, tão brasileiros quanto qualquer outro. Esse contexto é um terreno fértil para que se viralize uma narrativa de “nós contra eles”, uma narrativa que construa um inimigo comum capaz de unir o país, ou boa parte dele, contra. Não preciso, nesse momento, me ater a detalhes de como uma campanha de desinformação e difamação pode ocorrer, haja vista tanto a história da nossa comunidade como exemplos recentes no próprio Brasil: é possível ser tornado de amigo em inimigo mortal em apenas alguns toques de texto no Whatsapp.

Uma vez que no Brasil esse cenário ainda não tenha encontrado a chama que lhe acenderia, parece-me que nos restam duas opções: fecharmo-nos em nossas sinagogas, famílias e amigos acreditando que essa onda de desinformação não virará contra nós ou falarmos ainda mais, dialogarmos mais, nos aproximarmos ainda mais dos brasileiros que nos veem distantes. E isso não é inédito para nós, organizações como, por exemplo, a Unibes tem um papel fundamental na promoção e no respeito à comunidade por meio de ações exemplares nas áreas da cultura, educação e trabalhos sociais. E assim, tantas outras o fazem. Mas, é preciso mais.

Precisamos expandir nossa rede de sensibilização, mostrar e compartilhar os valores judaicos da paz e prosperidade. Do bem comum, do tikun olam e da tzedaká. Embora estejamos vivendo em tempos onde parece que os pilares da sociedade estão mudados, uma coisa não mudou, desinformação, preconceito e ignorância se combatem com informação, carinho e acolhimento. Nossa vantagem é que temos e cultuamos nossa história e, portanto, temos menos chances de errar. Atentemo-nos.”

Chutzpah e a vocação israelense para as Startups – Tribuna 387

Compartilho meu mais novo artigo publicado na TRIBUNA JUDAICA sobre o incrível mercado das “startups” em Israel e que também vem crescendo no Brasil. O que podemos aprender com Israel para que o Brasil também se firme como celeiro mundial da inovação. Leia e comente!

“Chutzpah e a vocação israelense para as Startups
Floriano Pesaro

Você, leitor, provavelmente já ouviu falar um termo que está em voga nos últimos tempos: startup. Mas, o que isso significa, afinal? Qualquer empresa pode ser uma startup? Sim e não. Uma startup é necessariamente uma empresa pequena, mas com um plano de negócios que pressupõe práticas inovadoras com perspectivas de escala e alta lucratividade num contexto de extrema incerteza. Em outras palavras, uma startup é uma empresa que busca inovar no modo de prestação de determinado serviço ou produção de certo produto de forma única e nunca antes testado num modelo de negócios. Alguns países, ou mesmo regiões, são famosos por serem “incubadores de startups”, mais um termo dessa nova geração. O Vale do Silício, nos EUA, é, sem dúvidas, o maior exemplo de uma região vocacionada e dedicada à inovação de base, de lá conhecemos o Google e a Apple, por exemplo. Dos 62 unicórnios – startups que ultrapassam o valor de mercado de US$ 1 bi – surgidas em 2019, 43 são norte-americanas, 2 israelenses (Monday.com e Lightricks) e 2 brasileiras (Loggi e Nubank), mas o que impressiona é que com uma população equivalente a apenas 4% dos dois outros países, Israel tem o maior número de startups per capital do mundo. Como isso pode, então, ser possível?

Há, pelo menos, duas explicações: uma de cunho cultural/religioso e outra de política pública. Aquela cultural/religiosa tem relação com o princípio básico por trás do processo de formação de uma startup que é o “espirito inovador”, ou seja, a capacidade de dar uma solução diferente e eficaz a um problema já conhecido. Quando jovens os israelenses são mandatoriamente convocados a prestar um tempo de serviço na IDF (Israeli Defense Forces) onde tem contato com as mais avançadas tecnologias em termos de defesa e comunicação e, ao mesmo tempo, são desafiados e encorajados a encontrarem soluções num ambiente desafiador e perigoso. Neste contexto, os israelenses passam a ser inovadores por uma questão de sobrevivência, mas, mesmo antes disso, já são encorajados a pensarem “fora da caixa”.

Ainda no âmbito cultural/religioso, é do seio da nossa comunidade o estimulo e encorajamento da autonomia do indivíduo seja nas práticas diárias ou nos serviços e tradições religiosas. Existe uma palavra Yiddish para isso “Chutzpah”, que significa ter coragem e ser ousado, ou audacioso. Significa tentar, apesar do risco de falha, ou abordar um problema de uma maneira que talvez possa ser considerada absurda. Como, por exemplo, quando, durante o feriado de Lag B’Omer, incentivamos nossos filhos a construírem as fogueiras, mesmo na cidade de Tel Aviv. As crianças controlam todo o processo, desde a coleta da madeira até a chama real.

Contudo, não basta um contexto cultural/religioso e, mesmo social como a percepção de falha como algo positivo na sociedade israelense, para se ter o país mais inovador do mundo, considerando sua população. É fundamental ter políticas públicas que acreditem e invistam nesse potencial. Israel possui a Divisão de Startups da Autoridade Nacional de Inovação de Israel dedicada fundamentalmente a promover e criar condições para o desenvolvimento do ambiente inovador em território israelense. Esse esforço que busca mitigar falhas estruturais que venham a dificultar ou impedir a inovação na burocracia estatal ou nas condições educacionais e de renda, já que se tratam de negócios de alto risco, é também direcionado a quem não é israelense e tenha uma boa ideia de negócio. A Divisão oferece acompanhamento de emissão de vistos e bolsas de até R$ 230 mil em dois anos para esses empreendedores que veem Israel como uma terra propícia para a inovação.

Se não bastasse ser chamativa em termos numéricos e de valor de mercado, o mercado de startups israelense mira, muito por conta das limitações geográficas que lhes é imposta, os problemas acerca da sustentabilidade do nosso planeta, como o modo – e o – que comemos. Segundo o último relatório da Divisão Nacional de Startups de Israel, o país abriga cinco das nove startups especializadas no desenvolvimento de carne cultivada (também chamada de carne limpa ou celular). Isso é carne, como a conhecemos, em todos os aspectos, cultivada em laboratório a partir de células animais, mas sem nenhum animal abatido. Nesse momento em Israel, as startups estão estudando, por exemplo, como escalar industrialmente a impressão 3D de carne sem origem animal, mas com as mesmas propriedades nutricionais, aparência e sabor; fabricando “proteínas de design” fermentadas a partir de plantas como substituto do açúcar para a indústria de alimentos e bebidas; e desenvolvendo versões veganas de queijos parmesão, mussarela e gouda à base de cajus.

Muitas das discussões que temos hoje acerca dos nossos modos de produção e prestação de serviços estarão, em muito pouco tempo, defasadas frente a estas inovações, quando pensamos no preparo dos nossos filhos para o futuro e na formulação das políticas públicas de longo prazo precisamos, inevitavelmente, tentar vislumbrar que futuro será este e quais serão os requisitos para ser bem-sucedido neste mundo. Parece-me que “Chutzpah” é uma palavra, então, para termos em mente.”

#SPparaTodos #Jew #Judaismo #Inovação #Startups

A importância da articulação política da comunidade – Hebraica 693

Compartilho meu mais recente artigo publicado na Revista do Clube Hebraica SP sobre a importância de ter uma comunidade articulada e com representantes atuantes na defesa do povo judeu em todas as partes do mundo. Leia e compartilhe.

“A importância da articulação política da comunidade
Floriano Pesaro, sociólogo

Em todo o mundo, com mais foco na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, chocados continuamos a assistir ataques antissemitas que pensávamos estar no passado, o último deles deu-se em meio ao Yom Kippur em Halle, na Alemanha, deixando dois mortos chocando autoridades alemãs e a comunidade europeia. Contudo, este tipo de ataque, embora cause choque e pânico, não vem antes que atos menos violentos, mas ainda carregados de antissemitismo o acompanhe, como na França que teve aumento de 74% no registro de casos de antissemitismo em apenas um ano, ou nos EUA com uma explosão de vandalismo em cemitérios judaicos depois do ataque de Pittsburgh. As razões do recrudescimento do antissemitismo são várias e complexas, mas uma delas quero me ater neste espaço: o poder do discurso das autoridades locais em inflamar esse tipo de atrocidade.

Na Alemanha, Bjoern Hoecke, o líder do partido populista Alternativa para a Alemanha (AfD) declarou recentemente que o memorial ao holocausto em Berlim era um “monumento de vergonha” e que as escolas deveriam dar destaque ao sofrimento dos alemães na Segunda Guerra. Enquanto isso nos Estados Unidos, vemos o Partido Democrata, tradicional lar de políticos judeus, ser tomado por um rompante antissemita ao ter alguns de seus quadros, inclusive dos mais conhecidos, como Bernie Sanders, empenhados na não aprovação da Lei Anti BDS (Boicote, desinvestimento e sanções” – uma campanha antissemita que preconiza a prática de boicote econômico, acadêmico, cultural e político ao estado de Israel). Ainda nos Estados Unidos, o apoio a uma suposta legitimidade do BDS vem imbuída de falas dissimuladas que tentam ligar o boicote antissemita à liberdade de investimento, ou desinvestimento, do empresariado norteamericano, quando, na verdade, ignora que estes mesmos preceitos liberais pressupõem a proteção das liberdades religiosas e, sendo Israel um estado judeu, é falsa a tentativa de descolar o judaísmo da existência de Israel.

O BDS é, de uma vez por todas, o boicote ao Estado Judeu e não a um determinado governo, de modo que, é sim, não só antissionista como absolutamente antissemita ao tentar punir toda uma Nação Democrática, a única de sua região, de modo cruel ao atingir até áreas como Educação, Saúde, Desenvolvimento e Tecnologia.

Enquanto nos Estados Unidos e na Europa, a comunidade judaica e suas lideranças parecem perder a bussola da relação com os líderes políticos ao, nos EUA deparar-se com o antissemitismo no próprio quintal, e na Europa serem alvo de grupos de extrema direita e rifados pelos grupos de esquerda por uma lógica eleitoral que busca arregimentar os novos refugiados, no Brasil nossas lideranças continuam, e ampliam magnificamente, suas relações com os chefes do Executivo, Legislativo e Judiciário. Não que isso signifique que nas terras tupiniquins o antissemitismo não encontra pascigo, mas que, por aqui, as lideranças da nossa comunidade têm voz firme, que é ouvida pelos mais altos escalões de governo, o que nos possibilita respostas rápidas e definitivas até aquele sinal mais recôndito de ataque a nossa existência e a nossa liberdade.

A Confederação Israelita do Brasil (Conib), a Federação Israelita do Estado de São Paulo (FISESP), o Clube Hebraica de São Paulo, a Ordem Independente B’nai B’rith do Brasil, nossas sinagogas e rabinos, empresários, políticos, intelectuais, e outras tantas instituições judaicas em solo brasileiro, somos todos, exitosos em nossa missão de, seja quem estiver no poder, nunca tergiversar do nosso objetivo e missão que é a defesa do nosso direito de existir, crer, estudar, trabalhar e cooperar, assim como sempre fizemos, com o desenvolvimento socioeconômico e intelectual do Brasil, essa grande terra que nos acolheu com tanto carinho.”

#SPparaTodos #Judaismo #Jew #Israel

O Brasil tem muito a aprender com Israel na Educação – Tribuna Judaica 386

Escrevi um artigo muito especial para a última edição da TRIBUNA JUDAICA​ fazendo um paralelo da política de Educação em Israel e no Brasil. As diferenças são evidentes e das mais variadas origens, mas não é disso que se trata – mas, sim – o que Israel fez e vem fazendo em termos de política educacional que podemos perfeitamente inspirarmos e replicarmos no Brasil. Recomendo a leitura abaixo:

“O Brasil tem muito a aprender com Israel na Educação
Floriano Pesaro

O Brasil, assim como Israel e outros 192 membros da ONU, acordou seu compromisso com a Agenda 2030, composta por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que versam sobre a erradicação da pobreza, segurança alimentar, educação, saúde, energia, água, produção e consumo sustentáveis, mudança do clima, dentre muitos outros.

Esses objetivos buscam tornar a sociedade mais equitativa e sustentável até a próxima década. Dentre eles, aqueles que versam sobre educação têm uma característica fundamental: como princípio, ou mesmo como meio fundamental para sua consecução, demandam integração entre a política educacional e o olhar transversal da política socioassistencial.

Esse que parece ser um entendimento sedimentado no mundo e principalmente em Israel, como abordaremos a seguir, parece não ser ainda sequer compreendido no Brasil. Segundo a Pnad Contínua 2016-17, 40,8% dos jovens brasileiros entram na fase adulta sem concluir o ensino médio. Os efeitos desse cenário são sentidos em sala de aula, mas pouco se fala de suas causas fora do ambiente escolar.

Já o cenário educacional israelense mostra-se diferente a começar com sua história: a primeira instituição de ensino superior do país foi criada antes mesmo do estabelecimento de Israel como um Estado, em 1924 com o Technion, o Instituto de Tecnologia de Israel, na cidade de Haifa. Os níveis de evasão escolar em Israel são incrivelmente baixos: 1,1%, quase inexistentes estatisticamente.

Enquanto isso, no Brasil, a assistência social, ao incorrer na pouca integração com a educação, desconhece o impacto de determinadas privações na aprendizagem e, também por isso, tem dificuldade em equacionar os desafios vividos pela criança e adolescente como um todo, uma vez que eles não são vistos como estudantes. Por outro lado, a educação depara-se com situações extraclasse que prejudicam a aprendizagem e parecem não ter sentido para o professor no contexto de sala de aula.

É fundamental desenharmos caminhos de diálogo e trocas de informações entre os profissionais da educação e da assistência social. Os jovens atendidos por esta política pública são os mesmos que o são naquela. Não é possível pensar o cidadão em recortes temáticos, uma vez que as privações da vida contemporânea se mostram cada vez mais multifacetadas.

Manter um jovem em sala de aula frente ao crescente desinteresse com o modelo de ensino tradicional, somado às tamanhas e variadas privações , é missão para cada uma das políticas públicas cumprirem juntas. É claro que, neste sentido, é fundamental que o Orçamento seja garantido e que dê conta do desafio, contudo, erramos quando restringimos a discussão apenas no investimento financeiro de um país na Educação. À exemplo, apesar do abismo que separa os índices educacionais brasileiros e israelenses, há um dado que nos aproxima: ambas as nações investem por volta de 5,7% do PIB em seus sistemas educacionais.

Este olhar cuidadoso com o aluno teve seu primeiro grande passo em Israel com a criação da Escola Democrática de Hadera, em Haifa, onde, em 1987, um grupo de pais e educadores criou uma escola inovadora: a proposta era organizar um espaço de ensino que garantisse o direito de escolha do estudante sobre o que aprender e como aprender, bem como na experiência cotidiana daquela comunidade. Em funcionamento desde então, a escola hoje pertence ao sistema educacional israelense e atende crianças e jovens de quatro a 18 anos de idade.

Nossa comunidade, que sempre foi influente nas importantes decisões e políticas públicas brasileiras, pode usar a experiência de Israel como exemplo de integração de políticas públicas e acompanhamento individualizado do aluno. Na cidade de Ramat-Gan, região metropolitana de Tel Aviv, por exemplo, a Secretaria Municipal de Educação usa a tecnologia para acompanhar em tempo real por meio de indicadores o desempenho dos alunos em cada uma das áreas do conhecimento e do convívio social, sendo possível identificar eventuais problemas na escola que tenham relação com sua vida social e em família.

É claro que temos que considerar as características históricas, geográficas e culturais que distanciam as realidades brasileiras e israelenses, mas o que se propõe neste artigo não é pontuar as razões pelas quais nossos sistemas educacionais são tão diferentes, mas, sim, chamar atenção para soluções inovadoras desenvolvidas em Israel – com quem já enxergou há muito tempo a necessidade do olhar intersetorial dentro da escola e com quem temos importantes laços de amizade e cooperação – que possam também ser aplicadas no Brasil.”

#SPparaTodos #Educação #Israel #jew #judaismo

É um despropósito dizer que Israel não é uma democracia – Revista da Hebraica

Na edição de setembro da Revista Hebraica falo sobre a força, a consistência e o que simboliza a democracia israelense na região. Leia o texto na íntegra:

É um despropósito dizer que Israel não é uma democracia
Floriano Pesaro, sociólogo

“Vez ou outra nos deparamos com irresponsáveis afirmações acerca da legitimidade ou amplitude da democracia israelense. Cheia de mentiras e impropérios, elas desprezam que a democracia israelense tem apenas 64 anos e pertence a um pequeno grupo de países – Estados Unidos, Grã-Bretanha e Canadá – que nunca sofreram intervalos de governança não democrática. Desde a sua criação, Israel foi ameaçado incessantemente com destruição. No entanto, nunca sucumbiu às pressões de guerra que frequentemente interrompem as democracias. E pressões deste tipo não faltaram, mas o conflito apenas moderou a democracia israelense que oferece direitos iguais a árabes e judeus, inclusive aqueles que negam a legitimidade do Estado.

Embora, o presente seja a melhor testemunha para a democracia israelense, vamos rememorar nosso passado: quando o sionismo surgiu no final do século 19, os judeus da Palestina e os milhares que se juntaram a eles não tiveram exposição à democracia. O domínio otomano ofereceu parcos traços de democracia e, em seus estágios finais, suprimiu os direitos humanos. Curiosamente, o comunismo – importado da Europa Oriental na forma de fazendas coletivas – Kibutz – influenciou a cultura política da comunidade judaica pré-estatal, ou Yishuv, muito mais do que as ideias republicanas ou de livre mercado.

Já no início do Yishuv, uma particularidade que delinearia a democracia israelense se mostrava: os partidos sionistas eram muito diversos – socialistas, religiosos, nacionalistas – e foram forçados a trabalhar juntos na busca pelo Estado judeu.

A democracia no Yishuv, então surgiu, não apenas da necessidade de construção do Estado, mas também do legado da tradição judaica: a Bíblia questiona o absolutismo e o direito divino dos reis e confere a cada indivíduo direitos e responsabilidades civis.

A democracia em Israel iniciou-se, então, antes mesmo do seu estabelecimento como nação. Já no Yishuv instituições democráticas surgiram, tais como a Assembleia, o Executivo e a Haganá. Direitos Humanos começaram a ser estabelecidos e uma embrionária imprensa iniciou seu trabalho com liberdade, apesar das repetidas tentativas dos árabes palestinos de combater o surgimento do Yishuv.
Já na sua independência, Israel declarou-se oficialmente democrática, livre e igualitária. Um Estado de Direito único em sua região. Todos os cidadãos gozavam a partir de então de igualdade de direitos sociais e políticos independentemente de religião, raça ou sexo, algo revolucionário e único no contexto do Oriente Médio. Ainda mais, foram garantidas liberdade de religião, consciência, idioma, educação e cultura, sem fazer quaisquer aspas sobre aqueles que pregam publicamente a destruição do Estado judeu. Sacramentando sua democracia, foi proclamada a Knesset com seus 120 lugares protegidos por um judiciário independente. O sufrágio, por fim, era universal.
Um sonho democrático em meio a uma região repleta de ditaduras e violações de direitos. Liberdade para falar, viver e ser quem quiser ser. Claro que todo o governo, e mesmo sistemas de governo, são passíveis de críticas e merecem eventuais ajustes de acordo com a evolução da própria sociedade, mas afirmar que Israel é antidemocrática é desconhecer sua corajosa história de luta pela liberdade, mesmo que esta, por vezes, ameace sua própria existência.”

Tribuna Judaica – Nem sempre Rosh HaShaná foi uma data tão importante

Compartilho meu artigo publicado na TRIBUNA JUDAICA deste mês sobre as raizes do Rosh HaShaná. Leia e compartilhe!

“Nem sempre Rosh HaShaná foi uma data tão importante
por Floriano Pesaro, sociólogo

Sabemos que Rosh HaShaná celebra o início de um novo ano em nosso calendário, mas sempre foi assim? A resposta rápida é: não. Não há na Torá qualquer menção a Rosh HaShaná enquanto um marco de um novo ano. O costume de celebrarmos esta data como um novo ano deu-se após o exílio na Babilônia, já no Segundo Templo. Explicamos.

Primeiramente, os antigos não tinham noção de quando o ano começou. Nem deram nomes aos meses: a Torá apenas os enumerou – “o primeiro mês”, “o sétimo mês”. Ainda durante o período do Primeiro Templo (do século 8 ao 6 AEC), o ano começava na primavera, no primeiro dia de Nisan e não em Tishrei, como comemoramos hoje.

Se mesmo considerando essa diferença fundamental – que já nos remonta a um passado com celebrações distintas – não for suficiente para convencer o leitor que houve uma transformação em nosso calendário, a lua nova de Nisan, em que se marcava o início do ano, não tinha um significado tão especial: sua “celebração” resumia-se a mais animais sacrificados no Templo do que o habitual.

Por outro lado, o primeiro de Tishrei, hoje comemorado como Rosh HaShaná, é mencionado na biblía como um feriado – ainda que muito menor e não ligado a uma ideia de “ano novo”. Pelo contrário. Levítico (23:24) diz sobre o primeiro dia de Tishrei: “No sétimo mês, no primeiro dia do mês, tereis um sábado um memorial de sopro de trombetas, uma santa convocação”.

É possível, então, que um significado original mais profundo do primeiro de Tishrei tenha se perdido no tempo. Pelos costumes, o o dia passou a ser marcado pelo toque de trombetas e mensageiros saindo para o campo apenas para lembrar aos israelitas que Sucot chegaria em duas semanas.

Quando os judeus retornaram, então, do exílio na Babilônia a Israel, no início do período do Segundo Templo (516 aC), as práticas religiosas judaicas haviam mudado profundamente. Por um lado, os nomes dos meses que usamos até hoje são os nomes da Babilônia. Tishrei, por exemplo, é um mês babilônico cujo nome deriva da palavra acadiana tishritu – “começo”.

Além disso, aqui temos a principal pista da mudança do significado do primeiro de Tishrei: os babilônios levaram muito a sério as celebrações do Ano Novo. Eles chamaram o feriado de Akitu (da palavra suméria para cevada) e Resh Shattim, o equivalente acadiano do hebraico Rosh HaShaná. Isso foi comemorado duas vezes por ano, no início de Tishrei e no início de Nisan, e durou 12 dias.

É possível inferir que os judeus absorveram sua veneração pelo Ano Novo a partir do exemplo babilônico, contudo não está realmente claro quando Rosh HaShaná começou a ser comemorado como um feriado de ano novo, embora claramente tenha sido durante o tempo do Segundo Templo, após o exílio babilônico. Tudo o que podemos dizer com certeza é que os livros escritos durante esse período, como o Livro dos Jubileus e o Livro dos Macabeus não mencionam nenhum “Rosh HaShaná”.

Floriano escreve artigo com Claudia Costin para o Globo sobre Educação e Assistência Social

Na edição do último sábado do Jornal O Globo foi publicado o texto de autoria conjunta minha e da educadora Claudia Costin sobre a importância fundamental da integração entre as políticas públicas de Educação e Assistência Social para melhorarmos a aprendizagem. Leia abaixo:

“Dentro e fora da sala de aula

Educação depara-se com situações extraclasse que prejudicam a aprendizagem

Claudia Costin e Floriano Pesaro
14/09/2019

O Brasil, assim como outros 192 membros da ONU, acordou seu compromisso com a Agenda 2030, composta por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que versam sobre a erradicação da pobreza, segurança alimentar, educação, saúde, energia, água, produção e consumo sustentáveis, mudança do clima, dentre muitos outros. Esses objetivos buscam tornar a sociedade mais equitativa e sustentável até a próxima década. Dentre eles, aqueles que versam sobre educação têm uma característica fundamental: como princípio, ou mesmo como meio fundamental para sua consecução, demandam integração entre a política educacional e o olhar transversal da política socioassistencial.

Busca-se desde o acesso universal à educação até a eliminação das disparidades de gênero em sala de aula, objetivos que nos levam, ao desenharmos os caminhos para sua realização, a termos que enfrentar diversas privações e violações que configuram uma condição de vulnerabilidade social do estudante. Segundo a Pnad Contínua 2016-17, 40,8% dos jovens brasileiros entram na fase adulta sem concluir o ensino médio. Os efeitos desse cenário são sentidos em sala de aula, mas pouco se fala de suas causas fora do ambiente escolar.

A assistência social, ao incorrer na pouca integração com a educação, desconhece o impacto de determinadas privações na aprendizagem e, também por isso, tem dificuldade em equacionar os desafios vividos pela criança e adolescente como um todo, uma vez que eles não são vistos como estudantes. Por outro lado, a educação depara-se com situações extraclasse que prejudicam a aprendizagem e parecem não ter sentido para o professor no contexto de sala de aula.

É fundamental desenharmos caminhos de diálogo e trocas de informações entre os profissionais da educação e da assistência social. Os jovens atendidos por esta política pública são os mesmos que o são naquela. Não é possível pensar o cidadão em recortes temáticos, uma vez que as privações da vida contemporânea se mostram cada vez mais multifacetadas.

Se o Brasil almeja ainda cumprir algum dos objetivos da Agenda 2030 de Educação, precisamos com urgência do estabelecimento de protocolos de comunicação entre as políticas públicas, como ocorre no Rio Grande do Sul com as Fichas de Acompanhamento do Aluno Infrequente (FICAI), que envolvem todas as políticas públicas do território, incluindo o sistema judicial, para tratar estrategicamente do caso de cada aluno que passa a não ser mais visto em sala de aula.

Embora seja esse um exemplo de política pública inovadora no cenário em que estamos, a estruturação da interlocução entre educação e assistência social não é nova — considerando o caso do prefeito Grama em Campinas, berço dos programas de transferência de renda — e nem é uma invenção fora da parametrização educacional. As normativas que norteiam a educação no Brasil — em especial a Lei de Diretrizes Básicas (LDB) e o Plano Nacional de Educação (PNE) — preveem a formação cidadã e o trabalho para a cidadania como partes de sua atribuição, a diminuição da desigualdade social e a busca pela igualdade de oportunidades como missão e, por fim, a compreensão de que o progresso na aprendizagem e, como um todo, a realização de uma educação de qualidade passam pelo enfrentamento de problemas que incluem a situação socioeconômica.

Não é diferente do que é previsto no campo da normatização da assistência social, que é organizada no Sistema Único de Assistência Social. A Política Nacional de Assistência Social (PNAS) traz a intersetorialidade como ferramenta fundamental para a garantia dos direitos de cidadania, além de prever que as ações no campo da assistência devem ocorrer em sintonia e articulação com outras políticas públicas.

Temos, então, como premissa, nos dois setores, o olhar multissetorial sobre o jovem, que deve ter à sua disposição em sala de aula ferramentas que lhe possibilitem vencer não só os desafios acadêmicos, mas também os de sua condição de vida. Trata-se então de operacionalizar essa integração já minuciosamente prevista nas normativas das políticas sociais a fim de cumprirmos objetivos de naturezas fundamentalmente diversas.

Manter um jovem em sala de aula frente ao crescente desinteresse com o modelo de ensino tradicional, somado às tamanhas e variadas privações , é missão para cada uma das políticas públicas cumprirem juntas, a partir da complementariedade de seus olhares, em especial a educação e a assistência social.

Da mesma maneira, se na primeira infância houver uma integração no desenho e implementação das políticas públicas, muitos dos problemas identificados em fases posteriores de escolaridade poderiam ser, em grande medida, atenuados. Além disso, o trabalho conjunto e intersetorial seria uma plataforma para abordarmos a criança inteira e não a fragmentarmos entre os múltiplos setores que tentam apoiar seu pleno desenvolvimento.

Quanto antes aprendermos a não feudalizar políticas públicas, melhor!

Claudia Costin é diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV; Floriano Pesaro é sociólogo, foi Deputado Federal, Secretário de Estado de Desenvolvimento Social de SP e Secretário Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social da capital paulista”