Tribuna – A resiliência das Grandes Festas

É chegada a época das Grandes Festas, dias particularmente especiais para nossa comunidade e fundamentais para a reflexão sobre nossos próprios atos. Teremos um mês repleto de festividades precedidas por muita autoanálise e introspecção.

Rosh Hashaná, Yom Kipur, Sucot e Simchat Torá ocorrerão em 30 dias. Contudo, neste artigo, vou abordar o período de dez dias entre o Rosh Hashaná e o Yom Kipur, no qual devemos realizar nossas reflexões, avaliar nossos atos, nos observar e pedir, verdadeiramente, perdão pelos pecados que por nós foram praticados.

Esse período tão simbólico e cheio de significados que espelham nossos valores é marcado por nossos encontros nas sinagogas, tanto para comemorarmos o sopro da vida no barro de Adão e Eva como também para rezarmos em conjunto, com o nosso povo, para nos redimirmos dos nossos pecados. Nossa reza em conjunto (betzibur) chega aos portões celestiais com muito mais força, pois demonstra a importância de as pessoas estarem verdadeiramente unidas em prol do bem.

Neste ano, contudo, nos depararemos com uma realidade bastante diferente. Distantes fisicamente, ainda estaremos juntos em alma, pensamento e oração, numa mudança significativa para nossa comunidade. Não obstante, essa não foi a primeira vez que as Grandes Festas tiveram que se adaptar aos tempos.

Iniciaremos com a celebração do Rosh Hashaná, a solenidade do início da vida ou o nascimento e a criação do mundo. Esse momento, conhecido como, literalmente, “a cabeça do ano” ou “ano novo judaico” tem início no dia primeiro Tishrei seguido por dez dias de reflexão e redenção até que, em Yom Kipur, rezamos para sermos inscritos no Livro da Vida. O calendário judaico segue o ciclo da lua.

Humildade, altivez e correção.

Esse momento de paz, concentração e profunda conexão com D’us é também um ato de humildade, altivez e correção. Enquanto seres imperfeitos que somos, revisitamos nossos atos e condutas em busca do perdão e da melhora. Trata-se de uma ação que nos coloca mais próximos da pureza da alma e da bondade. Quando somos inscritos no Livro da Vida, temos a oportunidade de sermos pessoas mais evoluídas no ano vindouro que, com base em nossos preceitos, tornaremos nosso entorno e, consequentemente, o mundo, muito melhores.

A simbologia da festividade é importante e marca todo o seu significado. A maçã com mel, nas refeições de Rosh Hashaná, simboliza a doçura desejada para o ano que tem início. O pão de chalá redonda simboliza o ciclo de eternidade da vida. Há também o tashlich, onde há o costume de se jogar farelos de pães em água corrente, de preferência com peixes, simbolizando a “limpeza” dos pecados.

Apesar das diferenças nas celebrações das Grandes Festas entre judeus ortodoxos e reformistas, ashkenazim e sefaradim, em tipo de reza, vestimentas, entre outras, o fim é o mesmo, o propósito é comum: elevar-se, preparar-se para uma nova jornada sendo uma pessoa melhor, mais próxima a D´us e a seus semelhantes.

Estamos passando por um novo momento que nos exige, e ainda nos exigirá, resiliência. Os efeitos da pandemia do novo coronavirus alcançaram, mais uma vez, o marco temporal das nossas Grandes Festas e, nem por isso, deixaremos de celebrar o milagre da vida e desejar nossa inscrição no livro sagrado.

Respeitando as regras de distanciamento social e os cuidados com a higiene, tenho certeza de que cada um de nós, principalmente aqueles que possuem a sorte de estar com a família e os entes queridos, poderão regozijar-se das bênçãos divinas do sopro da vida e, também, desfrutar da paz de seus lares e sinagogas para refletir sobre as condutas e as ações no ano que passou. Que todos tenhamos a humildade e a altivez de pedirmos perdão àqueles com quem nos faltaram compaixão e correção para que sejamos todos inscritos e selados no Livro da Vida.Shanah Tová Umetuká. Feliz 5782 e Boa Saúde!

Floriano Pesaro, sociólogo.”