Tribuna: “O poder da linguagem simples”

Amigas e amigos, compartilho com vocês nosso mais recente artigo – escrito por mim e pelo Vereador Daniel Annenberg – e publicado na TRIBUNA JUDAICA. Leia, comente e compartilhe.

“O poder da linguagem simples
Daniel Annenberg* e Floriano Pesaro**

Imersos nesse cenário inesperado e incerto imposto pela pandemia do novo coronavirus, a informação tornou-se a principal ferramenta para que a população compreenda e siga as orientações dos governos no combate a essa nova doença. As pessoas, por sua vez, dependem dessas informações tanto para se defender da doença, como para lidar com seus efeitos, como a crise econômica. Toda essa comunicação precisa ser confiável, efetiva e transparente. E mais importante: a linguagem usada pelo governo precisa ser simples, de modo que seja compreendida e esteja ao alcance de todos e todas, o que nem sempre acontece.

Mesmo antes da pandemia, tornar a comunicação entre governo e cidadão mais simples e fluída já era uma das nossas grandes preocupações. Por isso, assim que Daniel voltou ao seu mandato na Câmara dos Vereadores de São Paulo, no final do ano passado, apresentou o PL 226/2019, que se tornou a Lei nº 17.316 em 6 de março de 2020, e instituiu a Política Municipal de Linguagem Simples na capital paulista. São Paulo passou, então, a ser a primeira cidade brasileira em que o uso de linguagem simples, que busca fazer com que a administração pública se comunique de maneira simples, direta e compreensível com a maioria da população.

A Política Municipal propõe que a comunicação seja realizada por meio de um conjunto de práticas, instrumentos e sinais para facilitar a compreensão dos textos. Desse modo, fica estabelecido que as ideias, palavras, frases e a estrutura devem ser organizadas para que as pessoas encontrem facilmente o que procuram, compreendam e saibam utilizar a informação. Entre as diretrizes propostas estão “linguagem respeitosa; palavras comuns; termos não discriminatórios; linguagem adequada para as pessoas com deficiência; explicar termos técnicos quando necessários; evitar siglas desconhecidas”.

Não se trata de uma política pública acessória e de menor importância. A comunicação empolada tem sido uma das formas de exclusão da parcela mais vulnerável da população na solução de suas demandas e na discussão dos problemas da cidade. Como diz a professora Neide Mendonça, especialista na área, “escrever mal é desumano e antidemocrático, porque desrespeita um direito fundamental do leitor: compreender os textos que regulam sua vida de cidadão”.

Precisamos inverter o papel da comunicação na relação do governo com a sociedade. Ao invés de afastar, excluir e tentar dificultar a vida das pessoas, a linguagem precisa aproximar e incluir todos e todas que dependem dela para resolver suas demandas e participar das grandes questões de sua comunidade.

Foi com essa preocupação que em Israel, por exemplo, foram adotadas políticas específicas que visam simplificar a comunicação e promover o entendimento dos cidadãos, uma vez que a imigração é um forte componente da demografia israelense. É verdade que culturalmente, os israelenses possuem fluidez na sua comunicação, uma vez que o hebraico é uma língua bastante direta na sua etimologia, mas era preciso mais. Em 2013, o Knesset aprovou uma série de regulações para os serviços públicos determinando a aplicação de políticas de “plain language”, ou linguagem simples. Um exemplo dos efeitos dessa regulação foi no sistema de saúde Maccabi que determina o uso de “linguagem acessível e palavras simples” em informações sobre procedimentos de saúde aos pacientes.

A pessoa em situação de maior vulnerabilidade – que mais tem dificuldades para manter o necessário isolamento social neste momento – é justamente aquela que mais precisa de informações simples, acessíveis e esclarecedoras das autoridades públicas. Se ouvissem “bloqueio total”, “máscaras e luvas” e “vale de 600 reais”, ao invés de seus equivalentes em língua estrangeira, esses cidadãos e cidadãs certamente se sentiriam mais seguros, protegidos e incluídos.
Quanto mais simples a linguagem, mais próximos estaremos de uma sociedade democrática, transparente e, acima de tudo, mais humana.

*Vereador na Câmara Municipal de São Paulo
* Sociólogo e ex-deputado federal”

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