É
tempo de luzes, é chegado o Chanucá. A luminosidade desta data, por milhares de
anos, vem guiando nosso povo na fé e na resiliência. Agora, em momentos de
incerteza e apreensão, é às luzes da Chanuquiá, e seus significados, que
devemos nos ater.
A
festa de Chanucá nasceu como celebração da luta de um povo que, apesar da vida
modesta e pacífica, foi atacado e vilipendiado pela tirania movida pela
intolerância e o ódio.
Os
judeus já viviam na terra de Israel, onde livremente viviam, produziam,
manifestavam sua fé e exerciam seus costumes e rituais no Templo Sagrado de
Jerusalém. À época, sob os domínios do reino Selêucida, o povo judeu pagava
impostos para que pudessem viver sem incômodos.
Não
há, no entanto, preço que garanta a liberdade quando se vive sob um governo
autoritário, como mostra a história das nações. Transformar adversários em
inimigos, se mostra uma estratégia que não é saciada no primeiro alvo.
E
assim foi no reino Selêucida, o rei passou a utilizar a comunidade judaica como
bode expiatório por questões políticas e escolha pessoal do rei, de modo a
alegar que ofereciam resistência ao seu domínio. Então, com seu poderoso
exército, Selêucida invadiu a Judeia e profanou o Templo Sagrado proibindo a
leitura da Torá.
Ninguém
acreditava que a comunidade judaica, modesta em número e poderio militar,
poderia fazer frente ao exército tirano que comemorava a esperada submissão do
povo judeu. No entanto, judeus camponeses, liderados por Yehudá e seus quatro
irmãos, venceram os soldados e libertaram a terra de Israel da tirania
devolvendo a paz e a liberdade para todos.
É
neste ponto que entra a Chanuquiá: como parte da purificação do Templo, que
havia sido profanado com sacrifícios impuros, o candelabro teve seus oito
braços acesos com as luzes de Chanucá que brilharam por oito dias.
Rica
como é, a história do nosso povo traz muitos aprendizados. Valorizar a fé e a
perseverança são parte deles, assim como a liberdade e o respeito. Sempre, por
toda a nossa história, estivemos em lados opostos de autoritários e tiranos,
cuja aliança, quando celebrada, historicamente nos rendeu traição e
perseguição, vide o caso da Itália fascista.
Nosso
lugar sempre foi longe da agressão e da violência, mas próximos da paz e do
entendimento entre os diferentes. Esta é nossa essência e é o resultado dos
ensinamentos milenares cultuados na nossa comunidade.
Celebremos,
então, tocados pelas luzes da Chanuquiá, a primazia da fé e o triunfo da
liberdade reproduzindo, em nossas vidas, os ensinamentos de Chanucá.
Não
é incomum que, neste espaço, vez ou outra, faço alguns paralelos entre Brasil e
Israel. Não que os dois países guardem uma extensa lista de similaridades, o
que não é verdade. Mas, ambos, bem como outros países, vêm vivenciando
situações que se assemelham, especialmente, na política. Enquanto no Brasil,
uma coalizão de partidos de esquerda e centro venceram as eleições, em Israel
uma coalizão de extrema-direita levou o ex-primeiro ministro Benjamin Netanyahu
a um terceiro mandato. Em ambos os casos, há quem ouse não concordar com a
vontade popular.
Em
Israel, após cinco eleições em apenas quatro anos, Netanyahu recebe um inédito
terceiro mandato, mas, desta vez, sustentado por uma coalização de
extrema-direita religiosa. Imediatamente depois, grupos de oposição passaram a
tratar sua eleição como algo inaceitável ensejando o desrespeito à vontade dos
eleitores.
É
claro, por assim dizer, que a democracia não é a prevalência absoluta da
vontade da maioria, de modo que os governos democráticos têm, cada um na
extensão da sua Carta Magna, de garantir a liberdade e os direitos dos grupos
cujos representantes não foram bem sucedidos nas eleições. Em Israel, no caso
em tela, estamos falando de árabes israelenses e LGBTQIA+, especificamente.
No
Brasil, também recebeu um terceiro mandato inédito, o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, que, ancorado numa ampla aliança política, saiu vitorioso das
urnas. No caso brasileiro, quem está na outra ponta são partidários do atual
presidente, mas, também, eleitores que não viram suas escolhas vitoriosas e,
com seus motivos, temem as ações do presidente eleito.
Ambos
os cenários têm, vejamos, uma similaridade típica da democracia: os vitoriosos
recebem das urnas a legitimidade de governar de acordo com os anseios da
população, mas respeitando os direitos de todos. Se em Israel, a população
optou por uma coalizão de firme posição religiosa e à direita, é assim que o
novo governo de Netanyahu deve se portar, sem, é claro, desrespeitar os
direitos dos contraditórios.
Já
no Brasil, a população optou por uma coalizão de centro-esquerda com pautas
eminentemente sociais, mas de amplitude política. Ou seja, é um desejo popular
por um programa nacional de ordem mais prática do que ideológica, que seja mais
assertivo na resolução dos problemas da população e menos incidente sobre
discussões de costumes ou de outras ordens que não tenham a ver com a melhoria
da qualidade de vida.
E,
tal qual em Israel, é assim que o novo governo brasileiro deve se pautar em
respeito à vontade popular. Tanto lá, quanto aqui, cabe aos que não tiveram
suas visões de mundo respaldadas pela maioria eleitoral, que exerçam com afinco
e responsabilidade o papel de oposição e que, se assim quiserem, protestem
quando julgarem necessário.
O
único comportamento que, em ambos os casos, é reprovável e altamente perigoso é
o ensaio de uma “não aceitação” do resultado democrático. A este tipo de
atitude cabe total repreenda, uma vez que é negador da própria democracia e do
Estado de Direito.
Sabe-se
que, em tempos de redes sociais, as notícias falsas acabam criando alicerces
para moradas que parecem dar consistência a qualquer narrativa que agrade a
qualquer grupo, mas a verdade do mundo real se impõe: eleições livres, lá e cá,
expressaram as vontades populares dos israelenses e dos brasileiros. Cabe,
agora, o respeito e o exercício constitucional do papel de cada parte.
Estamos mais uma vez reunidos para mais uma celebração de Rosh Hashaná, um grande convite à reflexão sobre nossas atitudes e valores que praticamos em nosso cotidiano. É tempo de semear a união e o entendimento entre todos nós, apesar das diferenças que, eventualmente, venham a nos diversificar.
Sob a benção do Kidush e as luzes das velas acesas pelas nossas companheiras, vamos iniciar um novo ano marcado pelo entendimento, pela paz e pelo progresso.
Que nos unamos em torno dos valores da nossa comunidade em respeito à história do nosso povo, mas, também, ao futuro das próximas gerações: promoção da paz, da harmonia e da liberdade para, e entre, os povos – de modo a refutar e, ao mesmo tempo, se reaproximar daqueles que buscam disseminar o ódio, o rancor e o desentendimento entre irmãos.
Tamanho desprendimento em prol de um bem maior, no entanto, exige mesmo esforço, que só é possível com os rituais de espiritualidade, conexão e isolamento que Rosh Hashaná proporciona e pede a nós nestes dois especiais dias.
É preciso se desconectar do mundo exterior para nos conectar com nós mesmos: com nossos valores enquanto pessoas e comunidade. Reflitamos sobre o real significado da nossa fala e das nossas atitudes que, muitas vezes, passa ao largo da reflexão usurpada pela velocidade dos nossos tempos.
O que queremos deixar para nossos filhos – ledor vador – como exemplo enquanto sociedade em tempos difíceis como os que vivemos? Uma das virtudes da nossa comunidade é se ater com demasiada fidelidade aos ensinamentos da história passada por nós através dos escritos e dos elevados ensinamentos rabínicos.
E a história do nosso povo mostra, clara e fidedignamente, que frente à tirania e a opressão não nos resta outra missão que nos unirmos em prol da paz, da liberdade e da defesa dos nossos valores, costumes e crenças.
Uma das diferenças de nós, humanos, para as outras criações de D’us é a capacidade de exercermos o livre arbítrio e, com isso, nos empunharmos com as responsabilidades de nossas escolhas.
E é sobre isso, também, o Rosh Hashaná: o julgamento das nossas ações a partir dos ensinamentos da Torá e a oportunidade de corrigirmos nossa conduta baseados na fé e no intelecto.
Façamos desse momento introspectivo um momento de avaliação sincera e de reconexão com aquilo que nos une como comunidade da fé, do amor e da paz: que possamos comungar junto de nossos amados familiares um novo ano repleto de bençãos e cuja conduta seja determinada pelos ensinamentos da Torá.
Que 5783 seja um ano bom e doce e que possamos inicia-lo a partir do maior ato de humildade possível para um homem: aquele de arrepender-se perante a D’us para se tornar uma pessoa melhor, mas não só: para promover uma sociedade mais justa, humana e solidária.
Por algumas vezes, nesse mesmo honrado espaço, abordei sobre as lições que a História nos oferece sobre os riscos da aproximação com governos e regimes de traços autoritários.
Apesar de, reiteradamente, os regimes autoritários mostrarem-se ingratos a tudo e a todos que pode lhes ter servido para manter-se em algum momento, sempre é bom pontuar como esse tipo de governo não é compatível, nem momentaneamente, com nenhum aspecto da comunidade judaica e sua trajetória.
Nas últimas semanas veio à público a notícia de que a Agência Judaica para Israel, que promove em diversos países do mundo a aliá para aqueles que desejam imigrar para Eretz Israel, está sendo alvo de um processo judicial que pede o encerramento de suas atividades em território russo – algo que só ocorrera durante o regime soviético.
A justificativa oficial é que a Agência estaria “armazenando e coletando” dados de cidadãos russos em inobservância à lei local – veiculada pela própria mídia russa, sabidamente acompanhada sob o olhar atento do Kremlin – no entanto, não se verificou, segundo diplomatas israelenses.
Isso porque semanas antes do processo judicial ser instaurado contra a Agência Israelense, autoridades russas fizeram chegar, informalmente, a Embaixada de Israel no país de que o Kremlin estava incomodado com a explosão no número de russos e ucranianos judeus que deixaram o país com o apoio do organismo internacional rumo a Israel.
Esse é apenas o mais recente episódio sobre como governos de caráter autoritário, em algum momento, acabam por colidir de frente com os princípios judaicos, especialmente, no que se refere à promoção da paz, da harmonia e da liberdade entre os povos. Lembro-me, inclusive, de uma história pessoal, envolvendo a imigração de meu pai ao Brasil – Giorgio Edoardo Pesaro.
À época, os judeus italianos, como meu pai, fugiam do regime totalitário de Benito Mussolini que assolou a Itália e foi um dos precursores do que hoje conhecemos como “fascismo” – tipo de governo que soma aspectos populistas e nacionalistas com o reforço do poder estatal se sobrepondo às liberdades individuais com base no culto à figura de um líder.
Meu pai, Seu Giorgio, me conta, quando falamos sobre o assunto, que, no início, Mussolini surgiu na Itália sob um aspecto moralizante – alguém que ouvira as demandas do povo, sempre sujeito indeterminado – e “antissistema”, mas que, no entanto, era necessário para mobilizar as massas em torno de um governo que atendesse os princípios da economia liberal.
Ignorando, portanto, os sinais crescentes de que se tratava de um populista autoritário, a elite econômica, social e as classes médias italianas apoiaram Mussolini como primeiro-ministro – mesmo depois da famosa “Marcha sobre Roma” em que seu séquito, os “camisas-negras”, se tornaram conhecidos na perseguição aos socialistas.
Dentre esse apoio estava, inclusive, setores da comunidade judaica que viam naquele que viria a se autodeclarar ditador italiano alguém que poderia controlar os intentos grevistas e o que se tinha como ameaça comunista na época.
Entretanto, como a História insiste em mostrar, após ter sido nomeado, um dia depois da Marcha, como primeiro-ministro pelo rei italiano, Vitor Emanuel III, como mandavam as leis à época, Mussolini passou a usurpar do poder de seu cargo e, pouco a pouco, foi enfraquecendo as instituições e negando espaço no Governo àqueles que entendiam tê-lo apoiado – como os liberais econômicos e setores da comunidade judaica.
Já em 1925, Mussolini havia obtido tamanho apoio que mudara seu próprio título e passou a se identificar como ditador ou “chefe de governo” não mais se identificando como “primeiro-ministro”.
Assemelhando-se à trajetória nazista na Alemanha, Mussolini, já em 1938, passou a proibir crianças judias e professores judeus nos estabelecimentos de ensino de qualquer natureza, bem como demitiu judeus dos serviços públicos e militares.
Assim, milhares de judeus viram a ideia de um primeiro-ministro de pulso firme se transformar em mais um pesadelo de perseguição em nossa história. Da mesma forma que meu pai, tantos outros judeus italianos podem contar essa história, hoje, daqui do Brasil.
Seja na Rússia de hoje, na Itália de Mussolini ou na Alemanha nazista, onde existem regimes autoritários, da orientação política que forem, não haverá, por muito tempo convivência pacífica, com o povo judeu, suas crenças, valores e instituições calcados, fundamentalmente, na paz e na prosperidade.
Estejamos, portanto, atentos às conjunturas políticas que podem se mostrar favoráveis a uns e outros com perfil menos democrático, mas que pareça, à primeira vista, um “mal necessário”.
O que parece ser, normalmente, é o que se pretende, de fato. Os sinais da Marcha sobre Roma foram bastante claros, mas, infelizmente, o autoritarismo passou incólume e tomou proporções que poderiam ser interrompidas a tempo.”
Nessa edição, a revista do Clube Hebraica abre com uma matéria especial sobre as 21ª Macabíada, ou Olimpíadas Judaicas, a maior competição esportiva judaica do mundo – e uma das únicas competições atléticas internacionais reconhecidas pelo Comitê Olímpico Internacional (COI). Neste ano, após o intervalo decorrente da pandemia, judeus de todo o mundo voltarão a confraternizar e disputar eventos esportivos, sempre com centralidade nos valores Maccabi, entre os dias 12 e 26 de julho.
Muito já falamos aqui, inclusive no último texto, sobre essa competição que representa mais uma das inúmeras relíquias históricas e culturais que a comunidade judaica cultiva por toda a sua história. Vale a pena, então, conhecermos um pouco mais sobre a história do seu idealizador, Yosef Yekutieli.
Como sabemos, as Macabíadas nasceram do sonho de Yosef Yekutieli, um jovem de 15 anos que, inspirado pelas Olímpiadas e pela crença no papel do esporte como promotor da paz, elaborou o que seria a 1ª Macabíada em 1932 na cidade de Tel Aviv, em Israel. Yekutieli tem uma história pouco explorada nos livros, mas que nos ajudam a compreender a razão pela qual ele se dedicou ao esporte como ferramenta de busca pela paz.
O jovem judeu nascido no território russo, onde agora é a Bielorrúsia, teve sua educação formal em Tel Aviv, onde viveu sua adolescência e, também, teve o primeiro contato com o esporte pela prática do futebol no time “Maccabi Tel Aviv”. Tudo ia bem até o terror do conflito interromper seus sonhos com a eclosão da Primeira Guerra Mundial.
Em 1918, em meio ao extermínio judeu promovido pelo nazismo, Yekitueli foi exilado, assim como tantos judeus, em Anatolia, hoje sudeste da Turquia. O horror da guerra não combinava com a prática esportiva. Ambos são diametralmente opostos: basta lembrar que as únicas vezes em que não houve jogos Olímpicos foram nos anos de em 1916 – em decorrência da Primeira Guerra Mundial – e em 1940 e 1944 – em decorrência da Segunda Guerra Mundial. Não há esporte sem paz, mas há paz por meio do esporte.
Foi com essa crença que Yosef Yekutieli voltou a Tel Aviv, findada a guerra, e dedicou-se ao trabalho de estruturação da soberania israelense por meio da sua atuação profissional na Comissão Sionista, na Companhia de Desenvolvimento Territorial da Palestina e na Israel Electic Corporation, onde apoiou a aquisição de terras para construção de linhas de alta tensão de Naharayim a Tel Aviv.
Aqui tem outro aspecto importante na trajetória do jovem judeu que deixou sua marca no mundo do esporte e da paz entre as nações: não há paz sem soberania. Não há paz sem que seja garantido o direito supremo dos povos sobre seus territórios e, dessa forma, não haveria paz sem Eretz Israel reconhecida, estruturada e respeitada.
Após esse trabalho profissional, mas, também, comunitário em seu propósito, Yekutieli dedicou-se a fundar instituições esportivas – sua paixão que fora suspensa no advento dos horrores da Primeira Guerra Mundial.
Ajudou a criar a Associação de Futebol Eretz Israel, a Associação Atlética Israelense e o Comitê Olímpico de Eretz Israel. Tudo isso entre 1928 e 1933. Mas, foi durante esse processo que Yekutieli mais contribuiu pela paz por meio do esporte.
Durante o Congresso Mundial de Maccabi, em 1929, na Tchecoslováquia, Yosef propôs a criação da primeira Maccabiada – uma competição, baseada nos Jogos Olímpicos, que envolvesse judeus de todo mundo, onde não haveria perseguições, mas, sim, a celebração da paz e do esporte por diferentes nacionalidades.
Já na primeira edição, realizada, exatamente três anos após a proposta de Yekutieli, houve a participação de 400 atletas de 22 países em Tel Aviv no Estádio Maccabiah, que, a propósito, foi construído especialmente para esta primeira edição da competição.
A partir daí, Yosef Yekutieli viu sua semente brotar e alcançar, neste ano, a 21ª edição movimentando judeus de todo o mundo para celebrar e competir longe dos horrores da guerra que marcaram tão fortemente a trajetória do criador das Maccabiadas.”
Do total, segundo o levantamento da prefeitura, 2.749 (73,1%) utilizam as ruas como forma de sobrevivência —pedem esmolas ou trabalham irregularmente—, 401 (10,7%) pernoitam nas ruas e 609 (16,2%) são atendidos nos Serviços de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes (Saica) e em Centros de Acolhida Especial para Famílias.
O ativista Sebastião Nicomedes espalhou faixas pela cidade de SP para protestar contra a presença de crianças nas ruas – Sebastião Nicomedes/Divulgação
“Os dados mostram para a gente que, a cada 10 crianças em situação de rua, 1 pernoita nas ruas, 2 estão acolhidas e 7 sobrevivem dos recursos da rua. O conceito de criança em situação de rua fala de ruptura do vínculo familiar ou comunitário e de oportunidade de sobrevivência na rua”, explica o secretário municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Carlos Bezerra Jr.
Na última pesquisa do tipo, realizada há 15 anos, eram 1.842 crianças e adolescentes nas mesmas condições.
“Para ser considerada nessa situação, uma criança não precisa necessariamente pernoitar nas ruas. Por exemplo, ela pode sair da escola, passar uma ou duas horas vendendo balas na rua e voltar para alguma moradia”, afirma o secretário.
Das 3.150 crianças e adolescentes que não estão acolhidas, 1.953 (62%) têm atividades de trabalho irregular. O levantamento aponta ainda que 465 (14,8%) são acompanhadas por um adulto nas ruas e 235 (7,5%) estão em atividades ilícitas. Um mesmo jovem pode estar exposto a mais de um tipo de risco social.
“O nosso grande desafio é tirar essas crianças e adolescentes das ruas, porque viver na rua é o caminho para a morte. Eles sofrem diariamente todas as formas de violações de direitos, estão submetidos a vários tipos de violência, exploração sexual e comercial, doenças, ferimentos, acidentes, uso abusivo de drogas, vida sexual precoce”, diz o secretário.
Segundo Bezerra Jr., a crise econômica agravada pela pandemia e a retração dos programas sociais por parte do governo federal contribuíram para o aumento de crianças e adolescentes em situação de rua na cidade.
O estudo, encomendado pela prefeitura à empresa Painel Pesquisa e Consultoria, foi realizado com uma metodologia que envolveu três eixos: a escuta das pessoas que trabalham nos comércios, nas ruas e vivem perto de escolas e postos de saúde, a busca por pontos de concentração nas franjas da cidade em todos os distritos da capital, além da abordagem direta a crianças e adolescentes.
O censo também apontou as regiões que concentram o maior número de crianças e adolescentes em situação de rua —República (309), Sé (202) e Santa Cecília (196), no centro, Tatuapé (161), na zona leste, e Pinheiros (152), na zona oeste.
O levantamento identificou os distritos onde houve aumento desse público, comparado a 2007: Cidade Líder (de 6 para 39), São Mateus (3 para 34) e Aricanduva (1 para 11), todos na zona leste; Pari (6 para 97), na região central, e Tremembé (1 para 15), na zona norte.
Além disso, 11% dos jovens foram identificados em 28 distritos que a pesquisa de 2007 não contemplou, como por exemplo, Anhanguera, Brasilândia, Perus e Jaraguá (norte); Iguatemi, Cidade Tiradentes, Cangaíba e José Bonifácio (leste), e Parelheiros, Grajaú, Capão Redondo e Campo Limpo (sul).
“A metodologia em 2007 era muito imperfeita. Não tinha a estrutura tecnológica de hoje para levantamento, georeferenciamento, cruzamento de dados”, afirma o gestor.
Para o sociólogo Floriano Pesaro, ex-secretário de Assistência Social do município (2005-2008) e do estado de São Paulo (2015-2018), “as administrações têm negligenciado de forma profunda a atenção a crianças e adolescentes em situação de rua, que vem aumentando visivelmente na cidade”.
“Na primeira década dos anos 2000 nós tínhamos praticamente acabado com o trabalho infantil nas ruas. O censo mostra o quanto o poder público abandonou esse tema”, afirma.
Para o ex-secretário, a solução está no combate à extrema pobreza, com distribuição de renda para que as pessoas tenham o subsídio mínimo para alimentação e a criança precise ir às ruas pedir esmolas ou trabalhar. Também é preciso ocupar a criança na escola, com o ensino integral, afirma. “A volta do trabalho infantil rouba a infância e o futuro da criança e da sociedade, na medida em que a tira da escola”, diz.
De acordo com o censo, 2.227 crianças e adolescentes (59,2%) são do sexo masculino, 1.453 (38,7%) do sexo feminino e 79 (2,1%) não souberam ou não quiseram informar.
A faixa etária de 12 a 17 anos é a que concentra o maior número, com 1.585 (42%), seguida dos que têm até seis anos. Em relação à raça, 1.615 (43%) se autodeclararam de cor parda, 1.074 (28,6%) pretos, 811 (21,6%) brancos, 34 (0,9%) indígenas, 20 (0,5%) amarela e 1 morena. Outros 166 não souberam ou não quiseram informar.1
Após a análise do resultado do censo, a secretaria abriu um serviço de abordagem social exclusivo a crianças e adolescentes na região central da cidade e pretende ampliá-lo para os distritos de maior concentração desse público.
A pasta também abriu 1.200 novas vagas nos CCA (Centro para Crianças e Adolescentes) —que atua no contraturno escolar e recebe crianças de seis a 14 anos.
O primeiro será inaugurado na Penha (leste), para 120 crianças. Além disso, serão abertos Núcleos de Convivência Especial para Crianças e Adolescentes, que oferecerão atividades de convivência e atuarão no fortalecimento de vínculos para identificação das demandas de cada um.
A partir de setembro, serão entregues residências temporárias, voltadas a quem tem menos de dois anos em situação de rua e famílias com crianças menores de seis anos, prioritariamente. São casas modulares provisórias, de 18 m² com quarto, cozinha e banheiro. Nesses locais, pessoas poderão morar pelo período 12 a 18 meses.
Link original da notícia/Reprodução Folha de São Paulo: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2022/07/cidade-de-sao-paulo-tem-quase-4000-criancas-e-adolescentes-em-situacao-de-rua.shtml
“O “B” de Brasil em meio às novas intenções quanto aos BRICS” Floriano Pesaro, sociólogo.
Os brasileiros que puderam se atentar às notícias internacionais nas últimas semanas – haja vista a abundância de problemas caseiros pelos quais nos vemos rodeados, além de outros novos que estamos criando para nós mesmos – podem ter notado que a Argentina e o Irã oficializaram seus pedidos de ingresso permanente no conjunto de países denominado “BRICS” – acrônimo que reúne, diplomaticamente, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
A alcunha “BRICS” foi criada em 2001 pelo então economista-chefe do banco Goldman Sachs, Jim O’Neil, por meio da publicação de um estudo chamado “Building Better Global Economic> BRICs”, onde o economista defendia que Brasil, Rússia, Índia e China eram as apostas de poderio geopolítico e econômico num contexto de diversificação da ordem mundial “duopolar” representada pelos Estados Unidos e pelos países da Europa Ocidental.
O que começou com uma simples ideia se popularizou num ambiente onde China e Brasil, mais especificamente, figuravam nas páginas da economia e da geopolítica como atores internacionais relevantes com seus chamativos índices de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), papeis em conflitos internacionais e vultuosa mobilidade social de milhões de seus habitantes.
Em 2006, uma reunião entre os chanceleres dos quatro países, à margem da 61ª Assembleia Geral das Nações Unidas, deu o ponta pé inicial para a institucionalização do grupo que conta hoje com uma cúpula anual e com um banco de desenvolvimento – o “New Development Bank“, conhecido também por “Banco dos BRICS” com sede em Xangai, na China.
Já em 2011, na II Cúpula dos BRICs, por força diplomática da China, os quatro países aceitaram a adesão da África do Sul, que fez com que a aliança passasse a adotar a alcunha de “BRICS” com o “S” de “South Africa”. Ali, já se podia perceber que a China tinha planos ambiciosos para a iniciativa.
Com a África do Sul, os BRICS representam hoje 3,2 bi de pessoas (40% da população mundial) e 26% do comércio global de modo que, numericamente, são mais representativos que o G7 – grupo das 7 economias mais industrializadas do mundo, formalmente, mas também conhecido como “grupo dos países ricos” – que, por sua vez, agregam 700 milhões de pessoas (10% da população mundial).Muitos analistas, no entanto, criticam o agrupamento desde sua formação, especialmente, porque há pouca semelhança entre os países que o formam – vide a África do Sul e a China, por exemplo. Mas, o que chama atenção dos especialistas é que as motivações por ali estarem também não são as mesmas entre os membros.
O mundo hoje remonta a um cenário de “desdemocratização”, uma espécie de retrocesso no processo de implantação de democracias liberais, inclusive, com fragilidades em democracias ocidentais consolidadas, como nos Estados Unidos e no Brasil. Nesse contexto, existe um Estados Unidos “pós-Donald Trump” que tenta reestabelecer sua influência mundial após o período voltado à política interna promovido pelo ex-presidente republicano, mas que enfrenta questões internas graves como uma crise econômica de dimensões históricas e uma crescente desigualdade social, que não era característica. Também está posta uma saudosa Rússia que invade a Ucrânia com uma narrativa que deturpa e remonta o nazismo, mas que aspira os limites da antiga União Soviética com um governo forte e antidemocrático.
E, por fim, está uma China que cresceu tanto nos últimos anos a ponto de questionar sua própria capacidade de seguir produzindo riqueza, promovendo mobilidade social e aquecendo a economia mundial ao mesmo tempo que busca manter seu modelo de governo autoritário.
Com os Estados Unidos fragilizados internacionalmente, cujo auge foi a envergonhada desocupação do Afeganistão e com a União Europeia lidando com a imigração de refugiados ao mesmo tempo que tenta manter seus padrões de “bem-estar social”, os chineses passam a ver, então, um momento ideal para reforçarem a presença mundial e fazerem frente à ordem mundial representada pelo G7.É aqui que, há alguns anos, segundo especialistas, a China vê valor nos BRICS – afinal, é um agrupamento que surgiu de maneira orgânica, é representativo em termos populacionais e econômicos e, também, geográficos, uma vez que possui representantes em todos os continentes, com exceção da Oceania. Nesse sentido, foi objeto de surpresa para analistas internacionais saber que Argentina e Irã protocolaram, oficialmente, pedidos de adesão plena à aliança dos BRICS – após o impacto da notícia, soube-se que, como fora com a entrada da África do Sul, a China teve papel, juntamente da Rússia nesse processo, mais uma vez, numa tentativa de expandir seu poderio geopolítico.
É de causar espanto, no entanto, que o intento oficializado do Irã neste grupo tenha ocorrido com relativo silêncio pelas autoridades do Brasil e de Israel, uma vez que se trata de um país que ameaça abertamente a soberania israelense e a comunidade judaica, como um todo. Uma possível entrada do Irã no grupo, portanto, nada mais é do que uma tentativa do regime autoritário iraniano de quebrar seu isolamento por meio de uma aliança internacional com países de peso geopolítico, especialmente, a China.
Ato contínuo, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lijian Zhao, postou em suas redes sociais uma arte, conhecida por “meme”, em que comparava a população representada pelos BRICS e pelo G7 com o seguinte comentário: “Então, da próxima vez que eles falaram sobre “sociedade internacional”, você sabe o que querem dizer”. Trata-se de clara provocação aos países que compõem o G7 e, por outro lado, expõe que, de fato, daqui para a frente a China e a Rússia passarão a utilizar o bloco para fazer frente aos Estados Unidos e a União Europeia, especialmente, no que se refere às ameaças isolacionistas as quais são submetidos pelas ações antidemocráticas e pelas incursões em Hong Kong e na Ucrânia, por exemplo.
Por fim, convém à reflexão sobre o papel do Brasil neste bloco, a maior democracia da América do Sul, que passa, hoje, por uma fragilidade governamental de dimensões históricas e, por isso mesmo, se apresenta como ator coadjuvante nesse processo de mudança de direção nos objetivos dos BRICS.
A política externa brasileira sempre foi pautada pelo pragmatismo e pelo respeito ao princípio da soberania dos povos ditado pela tradição da Casa de Rio Branco – e isso é positivo e vai ao encontro da defesa dos interesses brasileiros.
No entanto, é preciso atenção sobre o compromisso do Brasil com os valores democráticos e com o respeito aos Direitos Humanos, conforme estabelecidos na Declaração Universal. Além do aspecto ideológico e moral, é preciso reflexão sobre as intenções dessa mudança nos BRICS – hoje tratado como tema lateral pelo Brasil, mas não pela China e pela Rússia, como pode ser visto – de uma aliança política para um fórum de contraposição às potências ocidentais.
É preciso, portanto avaliar, justamente pautado nas melhores práticas de Rio Branco, se estar na companhia de países como o Irã num agrupamento, onde a democracia e os Direitos Humanos são assuntos inconvenientes, é mesmo o melhor para o interesse do Brasil do ponto de vista geopolítico e diplomático.”
“Não esqueçamos da importância do esporte Floriano Pesaro, sociólogo.
Há, pelo menos, duas décadas trabalho especificamente com o tema do desenvolvimento social e humano em suas mais variadas facetas: desde o resgate da autonomia, da manutenção de vínculos, passando pela educação em suas diferentes formas até chegando ao empreendedorismo como geração de renda. Mas, um aspecto que, muitas vezes, é negligenciado nesse processo é a prática esportiva como gerador de virtuosidades.
Não se trata apenas do aspecto da vulnerabilidade social, onde o esporte indubitavelmente tem um papel determinante na superação do ciclo da pobreza, mas, também, a prática esportiva é fundamental para qualquer cidadão pertencente a todo o agrupamento socioeconômico possível.
Isso porque é através do esporte que o cidadão aprende a lidar com a vitória, mas também com a perda – inevitáveis momentos da vida. É na prática esportiva que se desenvolve o espírito de equipe que perpassa todas as outras questões marginais que possam diferenciar uns dos outros – habilidade tão fundamental nesses tempos atuais.
O esporte, seja ele qual for, é uma atividade tão potente que os impactos virtuosos dele advindos vão desde o campo pessoal, passando pelo senso de comunidade, pelo combate à evasão escolar e à violência e seguindo até mesmo às relações internacionais.
Afinal, os próprios Jogos Olímpicos, como os conhecemos hoje, tiveram sua primeira edição em 1896 em Atenas (Grécia) por idealização do historiador francês, Pierre de Coubertin, que via na competição esportiva entre as diferentes nações um propulsor da paz tão potente quanto a diplomacia.
É curioso, inclusive, ressaltar que o esporte é tão indissociável da paz entre os povos e os diferentes que os Jogos Olímpicos, na Modernidade, só não ocorreram em três anos específicos: em 1916, em decorrência da Primeira Guerra Mundial, e em 1940 e 1944, em decorrência da Segunda Guerra Mundial. Não há esporte sem paz, mas há paz por meio do esporte.
Ainda nesse sentido, há mais uma sinergia entre a paz entre as nações e a noção do esporte. Sabe-se que para haver paz entre os diferentes, é necessário que estes se reconheçam legitimamente. E foi com esse anseio que nasceu a ideia de promover jogos olímpicos entre atletas judeus a cada quatro anos: nasciam nossas conhecidas Macabias da mente e do coração de um jovem judeu de 15 anos, Yosef Yekutieli.
A este propósito, a próxima edição será entre os dias 12 a 26 de julho de 2022 e o escritório da Macabi Brasil – filiada à União Mundial Macabi – fica aqui mesmo na Hebraica, para quem quiser buscar mais informações deste que é o maior evento esportivo judaico do mundo e que acontece a cada quatro anos em Israel a partir daquele sonho do jovem Yekutieli.
Aliás, o anseio que promoveu a criação das Macabiadas – o reconhecimento do povo de Eretz Israel nas competições esportivas internacionais, como os próprios Jogos Olímpicos – se tornou realidade: hoje as Macabiadas fazem parte de um seleto grupo de apenas sete competições mundialmente reconhecidas pelo Comitê Olímpico Internacional (COI).
Portanto, quando falamos em esporte, estamos falando em superação pessoal, convívio comunitário e paz entre as nações. Tudo começa com o espírito esportivo, como este que temos a honra e a alegria de ver diariamente aqui na nossa Hebraica.”
Vejamos uma situação: os pais de uma criança estão descontentes, pelo motivo que seja, com a escola onde o filho está matriculado e frequenta regularmente as aulas. Os pais, então, ao invés de buscar outro estabelecimento de ensino resolvem que, amparados em materiais didáticos, darão, eles mesmos, a educação formal ao seu filho dentro de casa.
Que mal teria nisso considerando que os pais sejam de boa índole? Esse aparente verniz de normalidade esconde uma série de problemáticas de um dos mais recentes perigos para a sociedade e a educação brasileira: o chamado homeschooling, ou educação domiciliar.
A frequência no ambiente escolar é algo transformador na vida de todos nós. Temos, certamente todos, lembranças boas e ruins ocorridas nas salas de aula, corredores e pátios.
Para além dos fundamentais aprendizados que tivemos no período escolar, a nossa vivência com colegas, diretores, professores e demais funcionários do ambiente escolar nos ajudaram a compreender o mundo, mas, principalmente, os “diferentes mundos” em que cada um vive.
Afinal, tudo pode ser visto de ângulos diferentes e cada um, com sua vivência, tem suas próprias lentes para ver esse mundo. Essa noção de diversidade e tolerância nos é apresentada, pela primeira vez, no ambiente escolar e molda nossas vidas como seres, essencialmente, sociais.
Nesse sentido, surge, com mais intensidade em razão da pandemia, uma discussão em torno da educação domiciliar, o chamado homeschooling – disseminado pela primeira vez – na década de 60 – nos Estados Unidos pelo pesquisador John Holt da Universidade de Harvard. Em resumo, a ideia defendida por Holt é a da “desescolarização”, de modo que ele entendia que a educação formal, ou seja, o ensino das disciplinas poderia ser feito pelos pais de maneira menos custosa e mais flexível e dinâmica do que nos bancos escolares.
O que aparenta ser uma tese razoável, na prática, ainda mais em países tão desiguais como o Brasil, se mostrou, onde foi aplicado, problemática e potencializadora de violências e segregações sociais.
Um estudo coordenado pela professora Lisa B. Thorell do Departamento de Neurociência do Instituto Karolinska, na Suécia, avaliou o impacto da prática em sete países europeus e constatou a queda generalizada do desempenho escolar e, ainda mais grave, o aparecimento de sintomas ligados à depressão e outros distúrbios do isolamento social nos estudantes.
Não seria, no entanto, necessário estudo tão aprofundado para verificarmos que isolar uma criança do ambiente escolar tem, ao menos, três impactos imediatos: dificuldades de socialização; estranhamento com a diversidade das pessoas e do mundo; queda na aprendizagem; e, até aumento no caso de violência doméstica e abuso sexual contra crianças e adolescentes.
De acordo com dados de 2018 do Ministério da Saúde, 69% dos casos de abuso sexual contra crianças ocorreram dentro das residências e boa parte deles só pararam porque os professores, em sala de aula, notaram sinais físicos e, ou, psicológicos nas crianças.
É claro, que estes são casos extremos, mas são reais e ocorrem com indesejada frequência. Para além desse tipo de situação, é possível que tenhamos, com o projeto de lei que vem sendo discutido no Congresso Nacional brasileiro, uma geração de crianças e adolescentes que sejam menos capazes de desenvolver empatia com o próximo e que não compartilham nem mesmo a mínima visão de mundo uns dos outros.
A proposta em discussão no Brasil, apesar de exigir formação universitária dos pais e vinculação a uma instituição de ensino, é problemática porque, além de não ser meritória e nem oportuna neste momento do país, carece de critérios. Em Israel, por exemplo, a prática do homeschooling é prevista pelo Ministério da Educação israelense, mas como prática de exceção.
Lá cada pedido de pais que desejam educar formalmente seus filhos em casa é estudado com seriedade, inclusive, considerando um julgamento se os progenitores apresentam uma “visão de mundo bem estabelecida”.
Os israelenses têm, conhecedores dos males do extremismo, que o ensino domiciliar se torne um celeiro de futuros cidadãos que não compartilham dos valores da democracia, do conhecimento e da liberdade do próximo. Nós também deveríamos ter esse mesmo receio.
A escola é lugar de aprender, mas também é lugar de viver e conviver. De criar experiências, do encontro das políticas públicas de diferentes áreas e de proteger nossos futuros cidadãos. “
“A gentileza muda tudo Floriano Pesaro, sociólogo.
Estamos vivendo tempos de tensão, isso é inegável e parece que podemos sentir nas mãos quando andamos nas ruas. Mal saímos de uma pandemia e estamos assistindo uma guerra que, embora longe geograficamente, num mundo globalizado, também nos é trazida para perto.
Tudo isso às vésperas de um processo eleitoral – que não parece ser dos tranquilos. No entanto, apesar do contexto desafiador, há um jeito eficaz de prevenir situações de embate e tensões entre nós no dia-a-dia: e ele chama-se “gentileza”.
Segundo o sociólogo, Andrew Miles, estudioso do comportamento social da Universidade de Toronto, “fazer coisas boas faz você se sentir melhor”, cientificamente falando. Miles conduz um estudo que correlaciona atitudes de gentileza à melhora de quadros de depressão e ansiedade – tanto em quem pratica, como em quem recebe.
Já a professora especialista em educação da Universidade Florida Atlantic, cujo livro “Social Justice Parenting” tem sido referência no desenvolvimento de uma sociedade mais empática, afirma que “um gesto de compaixão e gentileza libera substâncias químicas no cérebro que ajudam a se acalmar” e que, como efeito, “neutraliza os sintomas da depressão” ¹
A base da gentileza, é bom lembrarmos, está na empatia e na concepção de que, por mais diferente que formos, ou por mais distantes estejam, em determinado momento, nossas ideias sobre um assunto, não há inimigos entre nós.
Não havendo a figura do mal no próximo, há, portanto, que se ter como aspecto fundamental nas relações a empatia, o colocar-se no lugar do outro. Sabemos que a pandemia afetou a todos, mas, a cada um, de formas diferentes.
Nós também sabemos que as redes sociais podem ser especialmente tóxicas em períodos de crise econômica, como a que estamos passando, e em ano eleitoral, com os humores a flor da pele num ambiente polarizado. Por isso, um ato de gentileza ou de civilidade com o outro pode desarmar uma verdadeira bomba de conflitos. Quantas vezes você já não presenciou uma discussão, uma briga, cuja motivação parecia ser tão banal? Nada que uma conversa em bons termos não tivesse resolvido.
Afinal, José Datrino, o “profeta Gentileza”, já nos dizia nos idos dos anos 80 nas esquinas cariocas: “gentileza gera gentileza”. Por vezes, aquele respiro de dez segundos, quando recobramos a paciência e o bom senso, podem fazer a diferença na manutenção de um convívio, uma amizade, um amor, ou até uma vida.
Não foi, não está sendo e não deve ser fácil passar pelos próximos meses com os nervos em estado de calma, todos sabemos disso. O mundo passa por um momento atribulado em todas as áreas e o Brasil não está apartado disso, tão pouco imune está nossa tão unida comunidade e nosso tão querido clube.
Por isso, amigas e amigos, os tempos pedem calma e empatia pelo próximo. Não existe inimigos entre nós, existem ideias distintas com o mesmo ideal de paz e prosperidade pelo qual lutamos diariamente e por onde acreditamos ser possível construir uma sociedade mais justa, humana e fraterna para nossos filhos e netos.”